sábado, 14 de janeiro de 2012

Ortónimo: fragmentação, autodesconhecimento e dor de pensar


           A dor de pensar é o segundo tema abordado em Pessoa ortónimo.
     
          O sujeito poético submete-se a uma análise psicológica, chegando a diversas conclusões.
         A primeira é que se sente fragmentado e diverso, não se sentindo uma pessoa só. Esta fragmentação é resultado da passagem do tempo, que o impede de permanecer sempre o mesmo, porque aquilo que foi no passado já não é no presente e no futuro será diferente também. O sujeito poético está, assim, em constante mutação. Esta mutação também é resultado da influência que os outros têm sobre si, condicionando as suas vontades. Diverso e móbil, o sujeito poético sente-se inadaptado.


Ex:
“Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,

Não sei sentir-me onde estou.” – 2ª Estrofe do poema Não sei quantas almas tenho



·    Pessoa sabe que é impossível ser consciente e inconsciente simultaneamente, porque estes estados se opõem. Conscientemente, pensa-se; inconscientemente, sente-se e vive-se -- e é aqui que o seu sofrimento começa: por não conseguir parar de pensar, não consegue sentir e, por isso, não consegue realizar os seus desejos e vive frustrado.

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O pensamento é insaciável, porque quem pensa quer sempre saber mais e, por isso, nunca se satisfaz. Pensar é inútil, porque inibe a felicidade e impede de chegar a quaisquer conclusões.


Ex:

"Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doira
Sem literatura." - v5/8, est1, Liberdade



·    Por isso, gostava de não pensar, mas ao mesmo tempo queria saber que não estava a pensar.

Ex:
“Ah, poder ser tu, sendo eu!
Ter a tua alegre inconsciência
E a consciência disso!
” – 5ª quadra do poema Ela canta, pobre ceifeira



 
 
Nesta quadra, o sujeito poético faz um apelo à ceifeira, para que consiga ter a sua inconsciência e ao mesmo tempo ter consciência disso.

·    É referido também a dor que resulta da distância imensa entre o que se quer – ou seja, o Tudo – e o que se realiza – ou seja Nada. Os seus projetos nunca se realizam por completo porque o que ele quer atingir é  infinito e o que é consegue atingir é nada. O que surge desta situação é um enorme sentimento de frustração.

Ex:
“Tudo que faço ou medito
Fica sempre na metade
Querendo, quero o infinito
Fazendo, nada é verdade” – 1ª quadra do poema Tudo que faço ou medito



·     Ao pensar o sujeito poético apercebe-se de que a vida é curta e que mais cedo ou mais tarde irá acabar, então decide que não vale a pena viver e, por isso, deseja a morte.

Ex:
“Pesa tanto e a vida é tão breve!
Entrai por mim dentro! Tornai
Minha alma a vossa sombra leve!
Depois, levando-me, passai!” – 6ª estrofe do poema Ela canta, pobre ceifeira






O sujeito poético, no ortónimo, sente-se, assim, condenado a pensar e acha que isso é mau, porque pensar impede-o de ser ele próprio, o que o impede de se autoconhecer.



Poemas sobre a dor de pensar: Não sei quantas almas tenho; Tudo que faço ou medito; Ela canta, pobre ceifeira; Gato que brincas na rua; Leve, breve, suave; Liberdade; Mar. Manhã.


a fragmentação e o autodesconhecimento




a dor de pensar (sentir/pensar, inconsciência/consciência)

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